"A liberdade jamais e dada pelo opressor, ela tem que ser conquistada pelo oprimido"

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domingo, 29 de outubro de 2023

VINTE E UM ANOS DE PRONTO SOCORRO


Hoje (29/10/2023), um dia depois do Dia do Servidor Público, eu completo vinte e um anos de Serviço Público no Hospital de Pronto Socorro Municipal Mário Pinotti. Lembro como se fosse hoje o dia em que Rômulo, Raiol, Solange e eu nos apresentamos ao diretor do hospital, o senhor Carneiro. Em 2002 eu trabalhava como Cinegrafista, Editor de Imagens e Professor de Informática. Então, por conta das habilidades com a informática (tempos em que pouca gente sabia usar o computador), fui trabalhar na Central de Abastecimento Farmacêutico do Hospital. Logo depois, sob a direção do senhor Árias, que não queria nenhum servidor com desvio de função, finalmente fui atuar na função de AOP - Portaria, cargo para o qual prestei Concurso Público. Naquele momento em que os servidores voltaram para as suas funções, eu vi muita gente arrogante e pseudo autoridade tendo de calçar as "Sandálias da Humildade" e aceitar sua função, mesmo a contragosto e engolindo a vaidade.


Os tempos na Portaria foram de muito aprendizado e, sob a Coordenação da senhora Dione, fizemos um excelente trabalho e fomos até premiados. Ao mesmo tempo, em minha vida pessoal e financeira foram momentos muito difíceis. Momento em que, além do gestor municipal, de forma ilegal, ter retirado meu Abono HPS, o que deixou um rombo em meu orçamento, também perdi um irmão, um sobrinho e, logo em seguida, minha mãe. Isso me abalou muito e teve influência negativa na minha atividade profissional. Porém, com a ajuda de minha esposa e filhos, consegui superar o trauma. Foi nesse momento que comecei a participar da Coordenação da ASSESMUB – Associação de Servidores em Saúde no Município de Belém. Com a ASSESMUB nós servidores nos organizamos para lutar por nossos direitos que vinham gradativamente sendo desrespeitados. Fizemos a resistência contra a extinção de vários cargos do Serviço Público de Belém, mas não conseguimos evitar. Quando o cargo de AOP - Portaria foi extinto pela Prefeitura de Belém e nós fomos remanejados para outras funções e em outros setores, eu fui para a função de Copeiro e, mesmo sabendo que não poderia ter sido remanejado para a função de Serviço Gerais (no qual atuam os Copeiros), não tive problemas e nem me neguei em assumir tal função.


Em junho de 2015, quando aconteceu o incêndio no prédio do Mário Pinotti, ficamos angustiados e muitos de nós tiveram de ser remanejados para outros hospitais. Ficamos muito felizes quando finalmente pudemos retorna ao nosso local de trabalho assim que a reforma do prédio foi concluída. Por conta de problemas tanto estruturais do hospital (que apesar de reformado, já veio com inúmeros defeitos) quanto por problemas da gestão municipal, tivemos momentos de grande dificuldade e desvalorização. Os elevadores viviam com defeito e, com pena dos pacientes que não tinham acompanhantes, muitas vezes eu colocava as dietas em bandejas e as levava pelas escadas até as enfermarias, isso quase resultou numa Hérnia de Disco e só não chegou a tanto porque, orientado pelo ortopedista, parei de fazer tal coisa. Depois, durante uma paralisação do Setor de Limpeza, que é terceirizado e cujos servidores não estavam recebendo salários há meses, eu escorreguei numa poça de mingau. O mingau derramou, o Serviço de Limpeza foi acionado, mas, por conta da paralisação de parte dos servidores daquele setor, não havia pessoal suficiente. O mingau ficou lá no chão, eu esqueci dele, pisei na poça, escorreguei e quebrei o tornozelo. Neste mesmo ano o nosso salário foi congelado e entramos num período de acirramento da desvalorização dos servidores.


Em 2020, durante a Pandemia de Covid-19, foi um terror, minha esposa e eu quase morremos. Com falta de ar e enfraquecido, eu precisei vir me apresentar ao setor de Atenção à Saúde do Servidor, isso para ser avaliado e não ser penalizado com falta no contracheque. Lembro da angústia e da humilhação de ter de aguardar no Estacionamento do Hospital, com ratos correndo por cima dos meus pés e água pingando de um aparelho de ar condicionado. Mas, eu estava fraco demais e cansado demais para esboçar qualquer reação. Chegou minha vez, fui avaliado e fui dispensado do serviço por mais alguns dias. Voltei ao trabalho dias depois e segui fazendo o meu melhor.


Em meados de 2021 aquela fratura de tornozelo, que eu havia sofrido ao escorregar em uma poça de mingau há alguns anos, deu origem a uma artrose e eu precisei fazer uma Artrodese Tibiotalar para eliminar o movimento do tornozelo e assim amenizar a dor insuportável que eu vinha sentindo. “Gato Escaldado” que sou, ao me afastar do serviço para me submeter ao procedimento cirúrgico, eu deixei cópias de todos os documentos (atestados, laudos, B.E. e RINA) em todos os lugares e em todas as oportunidades que precisava me apresentar. Mesmo assim, por conta da incompetência ou da má fé de quem recebeu esses documentos, eu tive os meus direitos desrespeitados com perdas em minha remuneração, isso por mais que tivesse sido um ACIDENTE DE TRABALHO a causa de meu adoecimento e necessário afastamento para o procedimento médico. Precisei retornar ao trabalho ainda usando muletas, isso para evitar ainda mais prejuízos financeiros.


Além do adoecimento físico, eu, por conta dos cortes ilegais em minha remuneração, também entrei num processo de adoecimento mental. Tive crises de ansiedade e precisei tomar medicação para combater tal problema. Recorri e consegui receber de volta tudo o que haviam tirado de mim ilegalmente. Mas quando o dinheiro caiu em minha conta, as dívidas já estavam bem altas. Para complementar a remuneração minguada e os cortes ilegais, comecei a fazer Extensão de Carga Horária no Plantão Administrativo e neste mesmo período, depois de vinte anos que entramos com um Mandado de Segurança contra a Prefeitura, finalmente o meu Abono HPS retornou ao meu contracheque e agora aguardo o pagamento do precatório referente aos valores retroativos não pagos. Continuei, no meu vínculo, na função de copeiro e lá fiquei até este ano de 2023 quando me convocaram de volta para a Função de AOP - Portaria, mesmo que esse cargo não mais exista no Serviço Público do Município de Belém.


Nestes vinte e um anos de trabalho, luta, resistência, persistência e resiliência, eu me formei em Serviço Social pela UFPA e com índice acadêmico acima da média, o que me deixa muito orgulhoso por saber a dificuldade que foi estudar enquanto trabalhava e dividia as demandas e os cuidados da família com a minha esposa que é Pedagoga. Neste período eu vi meu filho crescer e hoje estar às vésperas de ingressar no ensino superior.


O Pronto Socorro tem sido a minha segunda casa nestes anos e, apesar do estresse causado não pelo nosso trabalho, mas sim pela desvalorização e injustiças sofridas por nós servidores e as quais eu descrevi neste texto, eu tenho muito carinho por esse lugar e pelos colegas com quem eu tenho trabalhado por todos esses anos. Em todos os setores onde trabalhei, sempre me dispus a contribuir, dentro da legalidade e das minhas atribuições, com as determinações da chefia imediata. Na vida profissional e pessoal eu não gosto de ser considerado “bonzinho” e isso é coisa de quem também é Assistente Social (piada interna da categoria), prefiro ser considerado justo. Pois, tentando ser bom eu posso incidir em injustiça. Por isso, por favor, perdoem se as vezes eu sou muito incisivo em algumas questões. Já não tenho a mesma saúde e nem a agilidade que eu tinha quando ingressei aqui, mas sigo realizando as minhas atribuições com o mesmo empenho e dedicação. Enquanto isso, aguardo os próximos quatorze anos e a aposentadoria. Espero chegar lá com o mínimo de saúde para poder curtir, ao lado de minha esposa, os nossos filhos e netos lá na nossa casa em Cametá, às margens do Rio Tocantins.